sábado, 16 de agosto de 2008

Entrevista (2003)


Zé Ramalho, 53 anos, convida seus fãs para um passeio pela música popular brasileira em “Estação Brasil”, um CD duplo que comemora 25 anos de carreira. É o último disco de uma trilogia que começou em 1997 com a “Antologia Acústica” e prosseguiu em 2000 com “Nação Nordestina”. “A ‘Antologia Acústica’ está associada ao meu trabalho de mais sucesso como compositor. ‘Nação Nordestina’ está conectado com os autores do Nordeste e com a minha região através de um foco político. ‘Estação Brasil’ é a minha relação com o meu país, as coisas que ficaram durante os últimos 30 anos no meu subconsciente”.

O músico conta que há muitos anos acalentava um álbum como “Estação Brasil”. “É um disco de intérprete que queria fazer há muito tempo. Preparei uma caminhada para chegar até ele. A partir do meu sétimo disco, ‘De Gosto, de Água e de Amigos’ (1985), comecei a gravar músicas de outros autores: ‘Paralelas’, do Belchior. No disco seguinte, ‘Opus Visionário’ (1986), gravei ‘Um Índio’, de Caetano Veloso, e por aí vai.”

Para abrir o álbum, Zé escolheu a inédita “Nesse Brasil Caboco de Mãe-Preta e Pai João”, em que ele apresenta as matrizes da música brasileira. “É calcada numa cantoria de viola chamada ‘Brasil de Caboclo, de Mãe-Preta e Pai João’, uma modalidade que pertence aos martelos de 10 linhas onde essa rima é obrigatória. Nesse gênero, tem que se falar do Brasil Colônia, da chegada dos europeus na nossa terra. Uma reunião de conceitos da cultura musical: o batuque africano chegado através dos escravos, a sofisticação européia dos portugueses e as nossas flautas e cantos indígenas. A música brasileira sai toda daí”.

As duas músicas seguintes também são uma exaltação à brasilidade, “Águas de Março”, de Tom Jobim, e “O Trenzinho do Caipira”, de Heitor Villa-Lobos e Ferreira Gullar. “‘Águas de Março’ no original é erudito com jazz, esta também é sofisticada, mas procurei injetar uma brasilidade com os tambores do mangue beat, que são as trovoadas das águas de março”. Zé Ramalho marcou sua carreira por músicas que refletiam sobre coisas como o significado da vida e a busca do autoconhecimento, daí seu critério de afetividade o levou a canções como “Caçador de Mim” (14 Bis e Milton Nascimento) e “O Que é o Que É” (Gonzaguinha). “Em Caçador de Mim peguei uma coisa meio Bob Dylan, ela é muito envolvente. Na música do Gonzaguinha procurei fazer uma coisa dramática porque é muito filosófica.” De Djavan, Zé pinçou “Meu Bem Querer”, uma balada que o marcou muito na época em que estourou, 1980.

Som para levantar a poeira marca presença

Zé Ramalho passou no vestibular para canção romântica, mas o forró está bem representado. “Não Quero Dinheiro”, de Tim Maia, virou um forró arretado que ele vai aplicar nas festas de São João do Nordeste. “Esse formato que vem de ‘Frevo Mulher’ está muito ligado ao meu trabalho, sinto uma certa facilidade de adaptar algumas músicas a este formato frevo mulher, como eu chamo”. “Mesmo Que Seja Eu”, de Erasmo e Roberto Carlos, ganhou um arranjo parecido e também vai ser trabalhada nas festas nordestinas do meio de ano. Outra que vai levantar poeira nos terreiros é “Asa Branca” e Zé diz que, apesar de ser a enésima gravação do clássico de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, graças a uma idéia de Sivuca, ele conseguiu algo diferente, que mudou a harmonia para menor, dando tom triste, mas com pressão de ritmo.

Outro mestre lembrado é Jackson do Pandeiro, e sua conhecida “Cantiga do Sapo”, que Zé regravou com uma batida irresistível e um bem sacado corinho infantil de pergunta e resposta. E ele aproveita para alertar para a importância de seu Jackson. “Quem quiser cantar, tem que escutar cantores que saibam brincar com as palavras no meio dos compassos. Dois caras fazem isso muito bem, um lento, João Gilberto, em que os compassos estão passando e ele está correndo atrás. Jackson corre na frente, é mais rápido. Esses dois caras você tem que ouvir para saber brincar com as palavras, uma coisa sofisticada, um selvagem e o outro bem calmo”, diz ele, com um riso de quem aproveitou bem os ensinamentos da vida.

Fonte:
Revista Época

Um comentário:

cidadelimpa disse...

Maravilhoso o blog dedicado a este grande mestre de nossa música. sou cantor e arranjador e estou com um show em homenagem a Zé Ramalho - - O Roque do Zé - arranjos roque-chacundum para o som de Zé Ramalho. veja um clipe do show em:
http://www.youtube.com/watch?v=CCE0U_LM28c
ajude a divulgar o show e a obra deste gênio brasileiro!
abcs Leot

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